quinta-feira, 14 de junho de 2012

Zoomorfização e Licantropia


Entende-se por metamorfose a transformação física de um ser humano em besta, e, por zoomorfização, o comportamento do indivíduo semelhante ou igual à besta. A metamorfose pode ocorrer sem que o indivíduo se comporte como o animal metamorfoseado, ou seja, uma besta com comportamento humano, ou então o inverso, em que não ocorre transformação física, porém o ser humano se comporta de forma bestial. O ponto culminante dessas duas características seria o ser humano transformado fisicamente em besta e comportando-se como tal. 

O primeiro contato da sociedade ocidental com a metomorfose e a zoomorfização, segundo os registros históricos conhecidos até hoje, foi com a mitologia, através das obras de Homero, como Ilíada e Odisséia, das Metamorfoses, de Ovídio, do Eddas, das Sagas, entre outros.    

Os monstros mitológicos já demonstram sua particularidade metafórica de terem sido esquecidos por Deus, seres demoníacos e fabulosos que expressam sua agonia, dor e tristeza. Mary Del Priore trabalhou este tópico de forma exemplar:


Se, na bíblia, Deus anunciara que faria o homem à sua imagem e semelhança, o monstro significava uma ruptura com esse princípio. Mais além, o Levítico anunciava que os homens marcados por sinais físicos não poderiam oferecer serviços a Deus. Nessa lógica, o mudo revelaria, no silêncio da boca, as marcas de sua intimidade com o inferno, onde pinças de ferro lhe teriam arrancado a língua. O surdo, insensível à palavra de Deus, seria sensível unicamente aos rumores infernais. O cego tivera os olhos queimados pelo calor do inferno. O aleijado deveria seu desequilíbrio àquele de sua alma. O corcunda traria o peso de sua maldição às costas, sobre a qual se sentava, de tempos em tempos, seu mestre,o diabo. (PRIORE, 2000, p. 35).”


É exatamente este o ponto de partida para os estudos alegóricos que seguem acerca da licantropia: os monstros e monstruosidades mitológicas e a sua representatividade da dor e da misantropia.

Logo, os monstros nunca deixaram de fazer  parte da sociedade; muito pelo contrário, eles a representam. É um mundo alheado, mas intrínseco; repudiado, mas sempre presente. O licantropo começou a se fazer presente na sociedade monstruosa alegórica entre os séculos XVI e XVIII, perante acontecimentos que facilmente denunciam a sua constituição horrorosa.

No Brasil, a licantropia era uma punição a relações incestuosas. Em Portugal, no século XVIII, o filho mais novo que não tinha o irmão mais velho como padrinho era metamorfoseado. Observando esses fatos, fica fácil perceber sua relação mítica, citada anteriormente. Na literatura latina, na obra Metamorfoses, de Ovídio, há talvez o primeiro caso de licantropia registrado: o mito de Licaón.
Licaón, rei da Licaônia, era um tirano, um ditador supremo, que causou horror aos deuses do Olimpo quando serviu as cabeças dos filhos de Júpiter ao próprio pai como refeição. Seu costume canibal, sua necrofagia causou estranhamento aos deuses, que resolveram puni-lo, transformando-o em lobo, fazendo-o vagar em melancolia eterna pelo resto de sua existência: 

"(...) querendo falar, uiva o perverso:
Colhem do coração braveza os dentes,
Co matador costume os volve aos gados:
Inda sangue lhe apraz, com sangue folga.
A veste em pêlo, as mãos em pés se mudam,
É lobo, e do que foi sinais conserva:
As mesmas cãs, a mesma catadura,
E os mesmos olhos a luzir de raiva."
OVÍDIO, 2003, p. 25.


Esse primeiro caso de licantropia certamente influenciou autores ulteriores, devido à dentificação do ódio, da raiva e da melancolia com o ser lupino. O Romantismo do século XIX talvez tenha sido o período que mais sofreu inspirações desses seres. 

2 comentários:

Anônimo disse...

Nossa parceria tá dando certo hein Lobístico, ótima seleção de imagens!

Anônimo disse...

Oh Obrigado Gabriel! Estava bastante preocupado com isso!

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