O Lobo Como Símbolo dos Fugitivos
Em consequência da implacável guerra que o homem lhe
declarou, o lobo tem sobrevivido como o eterno fugitivo graças à sua notável
inteligência e inesgotável resistência física. Os velhos “armadilhões” de sempre
conhecem a dificuldade de enganar os lobos com as suas artimanhas de armadilhas
e ratoeiras; parecem ter um sexto sentido para detectar estes perigos,
evitando-os a tempo, como se Marte os quisesse proteger a todo o custo. Este fato
foi desde sempre conhecido.
Entre numerosas populações indo-europeias, os emigrados,
exilados e fugitivos eram apelidados de “lobos”. Já nas leis Hititas se dizia
de um proscrito que “se havia convertido em lobo”. Nas leis de Eduardo, o
Confessor, o proscrito tinha de levar uma máscara de lobo (wolfhede). O
patíbulo era designado em anglo-saxão “árvore da cabeça do lobo”. Numerosos
deuses protetores dos exilados e dos proscritos ostentavam atributos ou nomes
relacionados com o lobo. Como vimos, é o caso de Zeus Lykoreios e Apolo
Lykeios. Rómulo e Remo, filhos do deus-lobo Marte e amamentados pela loba do
Capitólio, também foram fugitivos desde a mais tenra infância. Segundo a lenda,
Rómulo teria estabelecido no Capitólio um lugar de asilo para exilados e
proscritos. Sérvio disse-nos que este “asylum” se encontrava sob proteção do
deus Lucoris, que se identificava com o Lykoreus de Delfos. A tradição narra a
aventura de Lopichis, antepassado do historiador Paulo Diácono que sendo
prisioneiro dos Avaros, evadiu-se e foi guiado por um lobo até a sua pátria,
Itália.
Há motivos para acreditar que são esses ritos e crenças,
intimamente relacionados com uma ideologia guerreira, que tornaram possível a
assimilação dos fugitivos, exilados e proscritos aos lobos. Para poder
subsistir, esses proscritos comportaram-se como os bandos de jovens guerreiros,
ou seja, como verdadeiros lobos. É sabido que, até ao século XIX, as reuniões
de jovens continuaram a incluir um banquete com víveres roubados a viva força,
atemorizando as aldeias.
Licantropia, a Lenda do Homem-Lobo
O que é a licantropia? Usemos o sofrido dicionário,
supostamente da Real Academia, que diz o seguinte: Licantropia, mania na qual o enfermo imagina estar transformado em
lobo.
Será possível? O Satiricon oferece-nos uma versão
completa do mito do homem-lobo. Efetivamente, um dos primeiros relatos desta
metamorfose maligna aparece num dos contos de Petrônio. Um livro não menos
divertido e maravilhoso, As mil e Uma Noites, no seu capitulo sétimo, conta o
que Basco Ibañez traduz como “História do
príncipe e a vampira”, mas como os vampiros nunca devoraram, mas apenas
sugaram as suas vitimas, é evidente que se trata de uma mulher loba. Inclusive
o seu afã de matar o príncipe e alimentar os seus cachorros com sangue fresco,
é instintos de loba, a qual reparte sempre a presa com os seus cachorros.
Platão e o historiador Heródoto, já tinham falado da licantropia. Eles mencionaram
também o acônito, essa planta de dupla utilização que por um lado induz o homem
a converter-se em lobo e por outro o cura da licantropia.
Os nossos antepassados não puderam deixar de observar que
o lobo tem uma relação especial com a lua. Os uivos do “noivo de Hécate” pela
sua amada deviam ser uma serenata constante para os homens que seguiam as
matilhas selvagens. Sob a luz brilhante da lua cheia, os lobos comunicam por
meio de uivos e assim se reúnem para caçar. A lua constitui uma grande vantagem
para o predador noturno, e o homem emulou o seu concorrente. A lenda da
licantropia persiste porque o lobo teve um papel importante no desenvolvimento
dos hábitos humanos de caça. O professor e psicólogo, Robert Eisler, assegura
que a lenda do homem-lobo procede de um passado obscuro: quando os homens
aprenderam a caçar.
Sem dúvida, Robert Graves escreveu que os guardadores de
gado da antiga Arcádia conceberam um papel diferente para o homem-lobo, mais
alinhado com as necessidades do seu modo de vida. Segundo a teoria religiosa Arcádia,
enviava-se um homem a viver com os lobos, este se convertia em homem-lobo
durante oito anos e persuadia os lobos a deixarem tranquilos os gados dos
homens e os seus filhos. Segundo a mitologia, Licaón, o primeiro rei de Arcádia
foi convertido em lobo por oferecer a Zeus o corpo de uma criança habilmente
cozinhado. Na Arcádia tinham o costume de imolar uma pessoa e, os assistentes
do ato “comungavam” devorando as suas entranhas. Ficavam então convertidos em
lobos e conservavam essa forma por oito anos, após os quais recuperavam a
figura humana se durante esse tempo não tivessem comido carne humana.
Na França há muitos relatos de seres que, à luz da lua,
têm o poder de chamar e dirigir matilhas de lobos. Os que estudaram o
comportamento destes cães selvagens sabem que um ser humano pode constituir-se
líder de uma matilha nas mentes dos lobos. Algumas pessoas reuniram matilhas de
lobos, como o personagem de Kipling no “O Livro da Selva”. Recordemos os
trabalhos realizados sobre este tema pelo Dr. Rodríguez da Fuente e outros
naturistas espanhóis.
A necessidade de se defender do lobo é um fato ancestral
que deu origem a rituais religiosos, de tal forma que, no arcaísmo das
religiões greco-latinas, encontramos divindades e gênios protetores do gado.
Esse é o caso de Pan e dos faunos. Na mitologia Vascã, temos um curiosíssimo
gênio protetor; de nome Basajaun, senhor dos bosques. A lenda descreve-o alto,
com forma humana e coberto de pelos. Quando este gênio está perto não há perigo
de que um lobo se aproxime. A sua presença é anunciada pelas ovelhas com a
sacudidela simultânea dos seus sinos. Apesar de se tratar de um homem-lobo de
grandes dimensões, tem boas intenções.
De qualquer modo, na península, é na Galiza onde está
mais arreigada a lenda do “lobisomem”. Na Europa a lenda é muito popular na
Alemanha, e em especial na zona dos Balcãs e dos Cártamos.
Em todos os lugares por onde o lobo tenha vagueado, as
pessoas contaram histórias estarrecedoras de homens e mulheres que assumiam a
forma de lobos e se alimentavam de gado e de seres humanos. Apesar de em quase
todo o mundo se pôr em duvida as histórias de autentica transformação física,
não podemos deixar de observar que uma lenda tão disseminada deve representar
uma verdade cultural e de comportamento. A maioria dos cientistas rejeitou totalmente
os homens-lobo enquanto sujeitos dignos de investigação devido aos preconceitos
existentes contra tudo o que signifique transformação mágica.
Continua... Aguarde a Parte VI...
Perdeu a PARTE I e a PARTE II ?! Clica aqui!
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